sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Emir Sader tirando as palavras da minha boca.

Reproduzo aqui um texto escrito por Emir Sader e publicado em seu blog na Carta Maior. Ele conseguiu sintetizar tudo o que eu penso sobre o Estado brasileiro. Aliás, tudo o que penso e espero de um Estado. Ele tirou as palavras da minha boca:



Um Estado para governar para todos
por Emir Sader

O Estado sintetiza, de alguma maneira, a sociedade que temos. O político condensa, sintetiza, o conjunto das relações econômicas, sociais e culturais – na visão de Marx.

O Estado brasileiro, antes de 1930, era literalmente o Estado das oligarquias primário-exportadoras: dos setores que produziam para a exportação e dos que comercializavam essa produção e importavam das metrópoles para o consumo das elites. Era um Estado de uma ínfima minoria, governando para o interesse dessa ínfima minoria. A grande maioria da população nem era contemplada pelo Estado, nem se reconhecia nele.

A primeira grande transformação do Estado brasileiro se deu a partir de 1930. O Estado começou a assumir responsabilidades sociais, contemplando a setores populares como cidadãos – sujeitos de direitos -, passou a incentivar a economia voltada para o mercado interno, permitiu o inicio do processo de sindicalização dos trabalhadores, formulou uma ideologia nacional e começou a aparecer como o Estado de todos os brasileiros.

Esse Estado, correlato aos processos de industrialização, de urbanização, de sindicalização, de democratização social e politica, teve um freio radical com o golpe de 1964. A ditadura militar se impôs como governo das elites dominantes contra os setores populares. Além da brutal repressão contra o campo popular e tudo o que tivesse que ver com democracia, impôs o arrocho salarial e a intervenção em todos os sindicatos, promovendo uma lua-de-mel para as grandes empresas nacionais e estrangeiras. Crescia a economia, mas não se distribuía renda, se concentrava a riqueza e se multiplicava a desigualdade e a exclusão social. O Estado tinha se tornado, de novo, um instrumento exclusiva das classes dominantes.

A democratização permitiu a recuperação de muitos dos direitos democráticos abolidos pela ditadura, permitindo uma nova identificação da população com o Estado, por meio da democracia. Mas esta coincidiu com a explosão da crise da dívida – uma divida alimentada criminosamente pela ditadura militar, que endividou o país sem benefícios para a massa da população e a juros flutuantes. Com a elevação brutal da taxa de juros, a economia do país quebrou, foi interrompido o processo de desenvolvimento econômico que, de uma ou outra forma, tinha se estendido desde 1930. Se desmoralizava a democracia, porque não promovia o bem estar da população e postergava a eleição direta do presidente, até que sua desmoralização levou à eleição de algum provindo da ditadura pouco tempo depois do fim desta, como presidente.

Collor, Itamar e FHC representam a era neoliberal no Brasil, em que o Estado foi reduzido às suas mínimas expressões, a economia foi desregulamentada, o mercado interno aberto aos capitais externos, as relações de trabalho foram precarizadas. O Estado tornou-se o Estado das grandes corporações nacionais e internacionais, sob o reino do mercado e da brutal reconcentração de renda que ele produziu.

O Estado voltou a ser desmoralizado nos discursos de Collor, de FHC, nos meios de comunicação, como inútil, negativo, que arrecada impostos tomando dinheiro dos cidadãos, que é ineficaz, burocrático, que prejudica o funcionamento dinâmico da economia. Em contraposição, se fazia a apologia do mercado, a quem foi entregue valioso patrimônio publico sob a forma das privatizações, deixando circular livremente o capital, para dentro e para fora do país, diminuindo ainda mais a presença do Estado nas politicas sociais. O Estado se afirmava, mais ainda do que no passado, como instrumento das elites do país, contra os interesses nacionais e populares.

Nos últimos anos o governo foi recuperando o prestigio do Estado. Os impostos foram sendo devolvidos à cidadania por intermédio das politicas sociais, pela melhoria do atendimento da população, extensão da educação publica, melhoria relativa da saúde publica. O Estado se responsabilizou por enfrentar a crise, impedindo que produzisse aqui – como em muitos lugares – uma recessão profunda e prolongada.

Mas tudo isso foi feito na contramão de um Estado que tinha sido feito para não agir, para deixar que o mercado ocupasse todos os espaços. Um Estado burocratizado, adaptado às irregularidades e corrupções, nada transparente, feito para manter a sociedade e o poder como eles são, incapaz de promover suas transformações democráticas.

Em primeiro lugar, o espírito público, a ideia de que não são funcionamentos do Estado, remunerados pelo Estado, mas são servidores públicos, remunerados com os impostos da cidadania e que se devem a ela, tanto na prestação de serviços, como no respeito às leis e normas.
Em segundo lugar, que ocupam cargos por concursos públicos, a forma mais democrática de preenchimento de cargos. Que devem prestar contas periodicamente à cidadania do cumprimento das funções que lhes são assignadas. Que devem ter plano de cargos e salários e avaliação permanente do seu desempenho.

Em terceiro lugar, deve haver transparência absoluta de quem financia o funcionamento do Estado e a quem o Estado transfere os recursos arrecadados. Hoje a estrutura tributaria é muito injusta, recaindo o essencial sobre os mais pobres, com o Estado transferindo uma parte do que arrecada para o capital financeiro, por meio do pagamento das dividas do Estado. O Orçamento Participativo é um instrumento essencial ao caráter púbico e democrático do Estado. Suas formas de existência tem que ser adequadas ao funcionamento eficiente do aparelho do Estado, mas tem que ser transparentes e ser controladas pela cidadania.

O Estado tem que governar para toda a população, tendo neste critério o filtro fundamental das suas decisões. Para que isso ocorra, a cidadania tem que ter mecanismos de informação – que podem ser via internet – e de discussão e controle da atuação dos governos. Os mecanismos de ratificação dos mandatos são uma das formas desse controle, quer permitem atualizar a legitimidade dos governos como produto da avaliação do seu desempenho.

Para que possa haver uma relação democrática e transparente entre governantes e governados, é preciso democratizar radicalmente os meios de comunicação, para que deixem de expressar um setor apenas – claramente minoritário hoje – da população, para propiciar informação minimamente fidedigna, espaços de debate que contem com opiniões que expressem de forma pluralista o que pensa a cidadania no seu conjunto e não apenas a minoria. Para isso é necessário uma imprensa pública – estatal e não estatal – que não seja financiada pelos grandes capitais privados – como acontece atualmente – e que amarra os interesses dessa mídia com os interesses dos mais ricos e poderosos.

Finamente, é necessário terminar com o analfabetismo e com o analfabetismo funcional – que somam a cerca de um terço da população – para que seja possível a informação e o debate generalizados por toda a população do país.

Consolidar, estender e aprofundar um governo para todos requer um Estado adaptado aos interesses das grandes maiorias do país, que demanda portanto profundas transformações – que podem ser obtidas mediante a convocação de uma Assembleia Constituinte autônoma, como a anunciada por Lula e por Dilma na recente campanha eleitoral.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Os parasitas

O PMDB, sucessor do MDB, partido de oposição ao governo militar e à ARENA, é um partido de história. Ele possui uma história, uma trajetória, e muito bonita, democrática e renovadora (em uma singela ironia com a extinta ARENA). É inegável que o Partido do Movimento Democrático Brasileiro tenha uma importância enorme na formação de nossa política e de nossa história, principalmente, no período de redemocratização. Porém, ao longo dos anos, o PMDB tem se afundado nas próprias divergências, em seu quadro político extremamente inflado e em sua fraqueza ideológica.

A primeira ruptura dentro do PMDB, foi quando FHC, Sérgio Motta, José Serra, Mário Covas, entre outros nomes tradicionalmente tucanos, fundaram o PSDB. Foi o primeiro sinal de que, devido à falta de identidade ideológica, importantes políticos do partido preferiram formar suas próprias legendas, erguendo as bandeiras de seus valores e ideais. Mas esta foi a única ruptura importante. Depois da fundação do PSDB, nenhum outro partido dissidente do PMDB surgiu. O partido continuou enorme, inflado, e ainda sem identidade ideológica.

Ideologicamente, o PMDB é um "partidão" de centro. Mas este centrismo do qual faz parte, é muito mais relacionado ao termo popular "em cima do muro", do que da corrente ideológica de posição moderada, defensora da justiça social dentro do capitalismo. Ao longo dos anos que se seguiram após a volta da democracia, o PMDB tem se mostrado um partido parasitário. Como não possui identidade suficiente para fazer um candidato próprio à presidência da república, prefere apoiar todo e qualquer governo eleito. Para esta missão, o fato de ser o maior partido do Brasil, ajuda. E muito. O PMDB é indispensável para a formação de qualquer base governista forte. Todo e qualquer partido que eleja seu candidato à presidência, necessita do apoio do PMDB, uma vez que este ainda é forte, tanto no congresso, quanto no governo dos estados.

E para que seus "aliados" nunca se esqueçam da importância do partido para a formação de qualquer governo, seus líderes não hesitam em demonstrar sua força através de ameaças, com o objetivo de achacá-los. Exigem a quota de ministérios e pastas que bem entendem ser úteis para si, não se preocupando com a competência ou eficiência do futuro gabinete. É exatamente o que está acontecendo agora, durante a formação do governo Dilma Rousseff. O PMDB pressiona seu aliado, o PT, indica seus ministros e ameaça ruptura se contrariado. Então, pressionada, Dilma cede os ministérios desejados - ou nem sempre - aos parasitas centristas. Nomes normalmente pouco técnicos, contrariando o que desejava a futura presidente para seu gabinete. Porém, há que se ceder às pressões parasitárias.

É uma pena que o PMDB ainda seja tão importante para o país, uma vez que se preocupa tão pouco com ele. Pensa primeiro nos interesses próprios. Sem contar os casos de corrupção e os nomes ilustres como os do Coronel José Sarney e de Orestes Quércia (que por sua vez, não se suportam e não se apoiam). Mas, assim é o PMDB. Uma orgia. Uma Torre de Babel política. Mas que, infelizmente, não mostra sinais de que vá ruir.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O abracadabra da política

Parece que não, mas há uma "fórmula mágica" para a política. Há uma equação, que se efetuada, pode levar partidos e seus líderes a triunfos políticos. Uma dessas equações poderia ser unir seus amigos, colegas, companheiros, ou seja, partidos políticos que compartilham da mesma ideologia, para a formação de uma base aliada fraternal. Mas a fórmula mágica das alianças políticas vai além disso. O foco principal não são seus amigos ou semelhantes ideológicos, e sim, seus inimigos.

Muito mais importante do que trazer para perto de si partidos políticos com afinidade para a construção de uma aliança, é que se identifique um inimigo comum. Um desafeto comum entre partidos de um país, semelhantes ideologicamente ou não. Com interesses comuns ou não. Muito mais importante que aliar-se ao seus "chegados", é construir uma aliança com o objetivo de derrubar um partido inimigo.

É o caso das alianças políticas no Brasil de hoje. Há alguns anos atrás, ainda antes do "mensalão", o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), o histórico partido de Getúlio Vargas, estava em plena harmonia com o PT, o Partido dos Trabalhadores. Ideologicamente semelhantes, e portanto, juntos em uma mesma base governista. Mesmo com a existência do "mensalão", PTB e PT permaneciam juntos por haver semelhança em idéias e posicionamentos sobre a política nacional. Nessa mesma época, o PP (Partido Progressista - do "progressismo" erroneamente caracterizado como liberal-) era da oposição. O "partido do Maluf", ex-PPB e PDS, herdeiro político da ARENA, fazia parte da oposição ao governo Lula. Já era de se esperar, o partido da ditadura contra o partido dos sindicalistas. Faz sentido. Hoje, porém, a situação é outra.

Nas eleições deste ano, o PTB estava ao lado dos demo-tucanos e de seu candidato, José Serra. O trabalhismo aliado ao conservadorismo e ao neoliberalismo de terceira via do PSDB/DEM. Uma aliança um tanto quanto duvidosa. Mas refletia o descontentamento da cúpula do PTB, que havia rompido com o PT meses depois do escândalo do "mensalão". Já o PP "de Maluf", estava aos poucos debandando para os lados da candidata petista Dilma Rousseff. O partido herdeiro da ditadura, se aliando à candidata ex-guerrilheira e subversiva? Reflexos da fórmula mágica da política: a união para enfraquecer ou derrotar um inimigo comum.

O PP, ao longo dos anos, se manteve neutro quanto a seu posicionamento na esfera política nacional. Durante o governo FHC, não fazia oposição, mas se negava a apoiar o presidente tucano abertamente. Claro que alguns de seus membros se identificavam com o pensamento neoliberal de Fernando Henrique, mas ainda assim, a posição do partido permanecia neutra. Chegada a Era Lula, o PP partiu então para uma verdadeira oposição. Porém, devido a desentendimentos passados, recusava-se a se aliar com os tucanos, tomando parte de uma oposição independente. Agora, em 2010, o PP se coloca oficialmente e a nível nacional ao lado da futura presidente Dilma. Uma posição jamais tomada pelo partido antes.

Com esta aproximação ao governo do PT, o PP pretende somente uma coisa: enfraquecer ainda mais os demo-tucanos. Provavelmente, a cúpula do "partido do Maluf" se cansou de ser a herdeira coadjuvante da ARENA, uma vez que nestas eleições o PSDB provou de vez sua inclinação golpista e direitista. O que o PP pretende é simples, derrubar ainda mais os tucanos e os democratas. Afundá-los ainda mais na lama. Não seria de se surpreender se, ao longo do governo Dilma, o PP se aliasse aos poucos com setores que nestas eleições mostraram apoio a José Serra. Seria perfeito. Ter setores conservadores da sociedade ao seu lado, e ainda assim, apoiando o governo petista. Seria como fazer uma oposição invisível, e portanto, extremamente perigosa.

Resta agora saber se, identificado o "inimigo comum", as alianças surpreendentes surgidas nestas eleições permanecerão. Ou se, ao longo da administração de Dilma Rousseff, as velhas divergências virão à tona e a quebrarão, fazendo cair a máscara daqueles que buscam nas alianças políticas nada mais do que parasitar os que estão no poder, tirando o sangue dos mesmos, para transformá-lo em veneno a ser destilado em eleições futuras.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Liberdade ou libertinagem?

Existe um bom e velho ditado que diz "para tudo há limites". Ele nos ajuda a compreender que, para mantermos a ordem e o bom andamento das coisas, temos que impor limites. Limites de comportamento, conduta, e até mesmo, opiniões. Logo, devemos diferenciar a liberdade da libertinagem, esta sendo a liberdade sem limites, que atropela direitos civis, principalmente coletivos, sendo extremamente nociva à sociedade.

Portanto, há limites para a liberdade de expressão? Para a liberdade de imprensa? Sim, há. A liberdade de expressão e opinião de um indivíduo acaba quando começa a atropelar os direitos do próximo, ou de um determinado grupo. A liberdade de imprensa acaba quando começa a prejudicar ou atrapalhar o poder da sociedade de refletir sobre seus próprios temas sem a necessidade quase viciante e aditiva dos chamados "formadores de opinião". A livre reflexão é a verdadeira liberdade de expressão.

Em 1984 o Brasil se livrou da ditadura militar. Se livrou de um regime neo-liberal nocivo à sociedade e aos direitos humanos, um regime "de exceção" que usava o totalitarismo para impor o poder e a vontade de uma minoria, de uma oligarquia. Com o fim da ditadura, um "novo" Brasil nasceu. Não foi um renascimento. Foi um nascimento de "reais liberdades" para a sociedade, uma sensação falsa e inevitável. Porém, este sentimento de que a liberdade havia chegado causou um efeito colateral: a total falta de atenção aos direitos coletivos. A chamada "liberdade", amparada pelos mais diversos setores como a mídia e a Igreja, passou a ser colocada em prática de maneira irresponsável e promíscua. Foi então que a liberdade de expressão, que a liberdade de imprensa, se convergiram em libertinagem.

Seguindo o padrão americano, o Brasil adotou o "American way of liberty", onde o direito de se expressar e direito à livre opinião reinam sobre os direitos coletivos, principalmente de minorias. Onde tais direitos só são respeitados quando amparados por instituições fortes na sociedade americana, como as Igrejas e grupos religiosos e o próprio governo. Hoje, a liberdade de expressão de Igrejas evangélicas é muito mais importante do que o direito básico que homossexuais, seguidores de umbanda e candomblé, e tantos outros grupos minoritários alvos de pastores e bispos evangélicos, possuem: o respeito. O mesmo acontece com a liberdade de imprensa. O direito que a mídia tem de se expressar, costuma atropelar o respeito que deveriam ter pelo governo, estabelecido democraticamente e que tem seus representantes escolhidos pelo povo. Mas esta questão merece uma análise mais profunda.

A mídia brasileira e seus donos, oligarcas das comunicações como os Marinho, os Civita, os Mesquita, os Frias de Oliveira, consideram-se "formadores de opinião". Sim, formam opinião, e da maneira como desejam. Defendem seus interesses, e não se preocupam em informar e tratar questões - principalmente políticas - de forma imparcial. São eles os principais defensores da liberdade de imprensa. São eles os que mais temem a regulamentação da mídia. Os irmãos Marinho, "Otavinho" Frias de Oliveira, Roberto Civita, Ruy Mesquita, entre outros, tornam-se os homens mais amedrontados em território nacional quando sentem que suas liberdades podem ser "censuradas". Ficam amedrontados, pois não querem ser obrigados a informar a população de maneira verdadeira, querem continuar distorcendo fatos, usando a liberdade de imprensa de maneira promíscua, sem compromissos com a verdade.

Portanto, a liberdade de imprensa acaba quando ela se torna nociva à sociedade. Quando ela distorce fatos, ou os inventa, buscando fazer seu jogo, defender seus interesses ou os de seus aliados. E é por isso que o controle social da mídia é tão importante. A história de que "a melhor forma de controle da mídia é o controle remoto", é pura asneira. Tal idéia, defendida inclusive por nossa presidente eleita Dilma Rousseff, é extremamente duvidosa e demagoga. Principalmente, porque nem todas as pessoas possuem o discernimento de escolherem o que querem ver. Não sabem selecionar conteúdo de maneira correta. Algumas pessoas em nosso país acreditam cega e piamente na mídia. No que vêem na televisão, no que escutam na rádio, ou no que lêem nos jornais e revistas. Logo, temos que defender esta massa manipulada da manipulação e de seus manipuladores. Se não, jamais teremos um povo consciente, que saiba refletir, que saiba "pensar com a própria cabeça", que possua opinião própria, sem a necessidade de "formadores de opinião".

Há quem diga que estamos entrando na era do "politicamente correto". Que nosso país, proibindo a distribuição de livros de Monteiro Lobato que possuam conteúdo que possa incentivar o racismo, por exemplo, está se tornando um país chato. Que o "politicamente correto" é chato. Acredito que as pessoas que assim pensam, são as mesmas conservadoras e defensoras do bom e velho Brasil de sempre. Que acham a modificação na estrutura social de "casa grande e senzala" pela qual estamos passando, incômoda. Estamos entrando em uma nova era. Na verdade, já entramos. O Brasil está mudando, e estamos nos preparando para ser uma nação respeitada, correta. Ou, pelo menos, alguns estão tentando.

Sem dúvida, neste novo Brasil que está se esforçando para nascer, não há espaços para irresponsabilidade. Nem para libertinagem de expressão, ou libertinagem de imprensa. Nem para preconceito, intolerância. Neste novo Brasil, é necessário que a sociedade se torne cada vez mais livre, realmente livre. Que possa pensar pela própria cabeça, e que aprenda a respeitar as liberdades coletivas. O bem-estar coletivo. Para resumir, o brasileiro precisa aprender que sua liberdade de expressão acaba quando começa a liberdade do próximo de ser respeitado, de viver livremente. E a imprensa precisa aprender que sua liberdade também tem limite, e ele chega quando esbarra no direito que os cidadãos têm à verdade e à informação real, responsável. É um duro aprendizado, mas indispensável para o progresso da sociedade brasileira. Doa a quem doer.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Os eternos derrotados

As eleições acabaram. O Brasil escolheu seu governante. Os brasileiros elegeram seu (sua) futuro (futura) presidente. Dilma Rousseff sai vitoriosa dessas eleições. Lula sai vitorioso dessas eleições. O PT, o socialismo democrático, a esquerda brasileira e latino-americana, o Bolsa Família, os sindicalistas, os mais pobres, todos saem vitoriosos dessas eleições. Mas, mais importante do que a vitória de uns, é a derrota de outros.

O PSDB perdeu. O DEM perdeu. O FHC perdeu. O neoliberalismo perdeu. E com eles, perderam as elites, a burguesia, a aristocracia brasileira. O "bolsa esmola" venceu o "vai trabalhar, vagabundo" (Santas palavras de Chico Buarque). A derrota acachapante dos tucanos pela terceira vez consecutiva, demonstra reprovação do modelo neoliberal imposto pelo PSDB e São Paulo ao Brasil. Demonstra uma reprovação do elitismo. Demonstra que o candidato da "massa cheirosa" e do "Príncipe dos Sociólogos", não pode vencer o "Sapo Barbudo" e sua candidata "terrorista subversiva". A esquerda tomou conta do país, doa a quem doer.

Num país historicamente desigual, é compreensível que um candidato que tenha feito o possível para reduzir a pobreza no país - atingindo seus objetivos nesse sentido -, torne-se uma espécie de "referência" para os mais necessitados. Pessoas de classes sociais mais baixas, portanto, jamais votarão outra vez em um partido que seja visto como "elitista", e que quando está no governo (como já sabemos todos), não faz o suficiente para combater a pobreza e a desigualdade social. Mas isso não é uma prática partidária. Nem pessoal. É uma prática ideológica. É o neoliberalismo, é o "laissez-faire".

O PSDB surgiu como um partido social-democrata, um partido adepto da Terceira Via, popularizada por Bill Clinton e Tony Blair no início dos anos 90. Esta surgia com um propósito nobre e útil para a política: gerar uma maior proximidade entre a esquerda e a direita. Incorporava maiores liberdades econômicas, globalização e privatizações para governos de esquerda, e maior influência estatal na economia, cuidados com o bem-estar e programas sociais para governos de direita. Era um balanço, um equilíbrio, um meio-termo entre esquerda e direita, entre socialismo e liberalismo. Porém, se a idéia inicial do PSDB era introduzir a Terceira Via no Brasil, ao longo do governo FHC essa idéia se esvaiu. Talvez graças à proximidade dos tucanos com os liberais conservadores do PFL, antiga ARENA. Em seu governo, o PSDB lembrou-se da parte direitista e liberal da Terceira Via. Privatizou, priorizou o câmbio, o controle da inflação e as políticas monetárias. Mas se esqueceu do lado social. Não combateu, com força, a pobreza e a desigualdade social. Muito pelo contrário, sua política privatizante e cambial causou ainda mais desigualdade, aumentando o abismo social no Brasil.

Hoje, o PSDB tornou-se um partido de direita. O neoliberalismo - uma verdadeira arma de destruição em massa em um país como o Brasil - tornou-se sua principal ideologia. E a democracia cristã também, como demonstraram essas eleições. Mesmo com seu patrono Fernando Henrique se declarando abertamente ateu durante os anos 80, o PSDB se tornou uma espécie de "Tea Party" brasileiro. Um partido defensor da moral e dos bons costumes, que nestas eleições obteve o apoio da Igreja Católica Brasileira, da CNBB, da TFP e de outras organizações conservadores católicas. O PSDB, portanto, deixou de ser um partido social-democrata, de centro-esquerda, e seguidor da Terceira Via. Hoje ele é um partido liberal conservador, de direita, uma espécie de filial moderada (ou não) do DEM, ex-PFL.

Após sua terceira derrota nas eleições presidenciais, chegou a hora do PSDB mudar. Ou melhor, se renovar, se reinventar. Ele não deve "olhar para trás", ou "trazer de volta sua identidade", como disse FHC. Ele precisa olhar para frente. O PSDB precisa progredir se quiser manter seu lugar de destaque na oposição. E uma das primeiras medidas a serem tomadas para que isso aconteça é deixar de lado o "paulistismo", ou "paulicentrismo". São Paulo não é o Brasil. E o brasileiro não vota em São Paulo. O brasileiro vota no Brasil. O PSDB tornou-se uma espécie de novo PRP (o extinto Partido Republicano Paulista, da república do "Café com Leite"), um símbolo de São Paulo. Um símbolo da oligarquia paulista e sudestista. E olhe que nestas eleições, até o próprio sudeste o traiu. Em Minas e Rio, deu Dilma. Portanto, o PSDB precisa sair de São Paulo. Precisa sair das elites. Precisa sair do neoliberalismo. Ele deve renascer, reviver seu lado social-democrata, progressista, de centro-esquerda. Precisa deixar de lado o discurso conservador e retrógrado, e tornar-se defensor da modernidade.

Os tucanos precisam aprender a viver o Brasil. A tomar decisões nacionais, e não regionais. Precisam de mais Aécio Neves, com o reflexo e proteção de seu falecido avô - o eternamente querido Tancredo -, e de menos José Serra e a sombra de FHC e sua era de desigualdades. O brasileiro não vota mais em moeda e estabilidade cambial. Brasileiro hoje vota em combate contra a desigualdade social e pela distribuição de renda. Portanto, o PSDB precisa esquecer Fernando Henrique. Esquecer Serra e São Paulo. Precisa olhar para o Brasil e trazê-lo para perto de si. Precisa trabalhar a imagem de um líder verdadeiramente simpático e carismático se quiser ter chances nas próximas eleições. Ou então, vão continuar com Serra "e FHC" (que não se gostam muito), com São Paulo ao invés do Brasil, e continuarão representando uma página virada de nossa história, uma era para qual os brasileiros olham e pensam: "ela cumpriu sua função, mas já passou. E agora, nunca mais".

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Podem me tirar os olhos...

Podem me tirar os olhos, podem me tirar as esperanças, podem me tirar a fé em um país melhor. Podem me tirar a crença em um mundo justo e igualitário, podem me tirar a alegria de ver o avanço daqueles que realmente precisam. Podem me tirar os braços que podem acenar em protesto, podem me tirar os pés que me fazem andar sempre para frente, podem me tirar a boca que é minha arma. Podem me tirar a vitória, a glória, a satisfação. Podem me tirar tudo. Eu permito. Mas jamais - repito, jamais - me tirarão minhas idéias. Minhas crenças. Jamais afogarão a consciência que há em mim. Jamais podarão minhas raízes ideológicas. Jamais me tirarão minha ideologia.

Nunca deixarei de acreditar no que acredito. Nunca deixarei de acreditar no povo. Na sociedade. Nas maiorias. Nas minorias. Nunca deixarei que minha paixão, minha solidariedade e minha luta por aqueles que realmente precisam, morra. Nunca deixarei de acreditar que o povo é a força de motriz de uma nação. Nunca deixarei de acreditar que o Estado pertence ao povo. E, por sua vez, nunca deixarei de acreditar que o Estado deve reger todas as coisas.

Pra não dizer que não falei das flores.

Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Caminhando e cantando
E seguindo a canção...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...

Pelos campos há fome
Em grandes plantações
Pelas ruas marchando
Indecisos cordões
Ainda fazem da flor
Seu mais forte refrão
E acreditam nas flores
Vencendo o canhão...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...

Há soldados armados
Amados ou não
Quase todos perdidos
De armas na mão
Nos quartéis lhes ensinam
Uma antiga lição:
De morrer pela pátria
E viver sem razão...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...

Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Somos todos soldados
Armados ou não
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não...
Os amores na mente
As flores no chão
A certeza na frente
A história na mão
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Aprendendo e ensinando
Uma nova lição...

Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...

=D

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Tapa com luva de pelica.

Nada como levar um tapa com luva de pelica, com elegância e sutileza, de Luís Fernando Veríssimo, não é Serra?
Segue o comentário elegante e bem educado de Luís Fernando Veríssimo após declarações de José Serra durante a sabatina do jornal O Globo com o candidato à presidência. Serra respondeu à uma pergunta de Luís Fernando Veríssimo, como sempre, de maneira ríspida e pouco humilde. Levou uma resposta à altura. Aliás, levou uma resposta de nível bem mais elevado. Vide:


"Foster Dulles"

"Não pude ir à sabatina dos candidatos à Presidência feita por colunistas e leitores de O Globo na semana passada, mas mandei perguntas por e-mail. Respondendo à minha pergunta sobre se, caso ele fosse eleito, a política externa brasileira voltaria a ser a que era antes do governo Lula, mais alinhada com os Estados Unidos, Serra respondeu que teria uma política própria, presumivelmente diferente da política do Fernando Henrique também. Mas antes fez um preâmbulo, lembrando o livro O Senhor Embaixador, em que, segundo Serra, meu pai se revela um admirador de John Foster Dulles, secretário de Estado americano que foi o grande estrategista da Guerra Fria com a União Soviética, famoso pela sua doutrina do “brinkmanship”, ou a arte de levar as confrontações até a beira de uma guerra quente, sem dar o passo fatal. “No caso da família Verissimo, houve uma alternância”, disse Serra, pois o filho, eu, “passou para o lado contrário em matéria de questão externa”. Não entendi: o lado contrário do que, da Guerra Fria? Posso garantir que não sou pelo alinhamento da nossa política externa com a União Soviética contra o Foster Dulles, mesmo se conseguíssemos encontrar os dois ainda vivos, e mesmo que meu desejo valesse alguma coisa.




Como eu, o Serra deve ter lido O Senhor Embaixador há algum tempo. Não surpreende que não se lembre bem do que leu. Foster Dulles foi, sim, uma figura admirável, do ponto de vista puramente literário. Incorporava um certo tipo de aristocracia americana que durante algum tempo fez do Departamento de Estado o seu feudo fechado e do anticomunismo sua principal faina intelectual. Depois, esse patriciado estanque foi substituído por tecnocratas tipo McNamara, que deram o passo fatal além da beira e empurraram o país para o abismo do Vietnã. Nenhum tinha aquela empáfia de nascença que caracterizava Dulles e seus pares e mal camuflava sua arrogância. Meu pai não admirava a política de Dulles, Serra. Um personagem do livro expressa sua opinião sobre Dulles como a fascinante figura literária que foi.


O Senhor Embaixador foi baseado, em boa parte, na experiência do meu pai como diretor de assuntos culturais da União Pan-Americana, ligada à Organização dos Estados Americanos, em Washington, de 1953 a 1956. A personalidade que, este sim, ele mais admirou no período foi Alberto Lleras Camargo, ex-presidente da Colômbia pelo Partido Liberal que dirigiu a OEA até 54 e saiu do cargo fazendo um famoso discurso em que desancava a intromissão americana em assuntos internos da América Latina e propunha um novo relacionamento, não submisso, dos latinos com os Estados Unidos. Lleras Camargo foi o primeiro estadista latino-americano da sua estatura e com suas credenciais a dizer coisa parecida. Recomendo ao Serra que, quando tiver tempo, leia Solo de Clarineta, vol.1, livro de memórias do meu pai, para saber com que figuras ele realmente simpatizou, na época, e com quem concordava."

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Brasil, o cesto de lixo político.

O Brasil é hoje uma das grandes promessas do futuro. Não é à toa que fazemos parte do BRIC (bloco de países emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China). Somos também os líderes do ranking de países que lutam pela redução da pobreza. Somos hoje líderes regionais. Presidentes de todas as nações do continente vêm ao Brasil para pedir "a benção" do nosso Chefe de Estado. Somos hoje um dos países mais influentes do mundo. Tanto política quanto economicamente. Deixamos de ser um "paisinho" em desenvolvimento, aliado à política americana, submisso ao neoliberalismo, para nos tornarmos mais um país governado pela esquerda, mas de enorme importância para o andamento do capitalismo mundial.

Porém, se na política externa e na economia vamos indo bem (ainda com muito que melhorar), na política interna, ou seja, no nosso próprio quintal, vamos de mal a pior. Isso se deve ao fato de que o brasileiro não sabe mais em quem acreditar. A ética na política parece que se tornou uma coisa distante, rara. O que deveria ser o básico se tornou um artigo de luxo que pode acompanhar, ou não, partidos políticos e seus membros. Exemplo disso é o PT, partido que nos governa hoje. Subiu ao poder em 2002, como a nova esperança do povo brasileiro, um partido popular, trabalhista, íntimo dos mais necessitados de nosso país, e porta estandarte da esquerda brasileira. Tal imagem, limpa e imaculada a nível nacional, foi dizimada com o surgimento do escândalo do Mensalão em 2005 e 2006. O PT manteve-se no governo, pois puniu alguns (somente alguns) responsáveis pelo escândalo. Mas salvou-se, na verdade, graças à popularidade do presidente Lula entre o povo. Foi a credibilidade do próprio Lula, e não mais a do PT, que manteve seu governo em Brasília.

Após o Mensalão, o PT passou a figurar na galeria dos "partidos não-confiáveis", junto a outros partidos já conhecidos por escândalos de corrupção, como o PP do ilustre Paulo Maluf. Logo, os políticos do PT perderam sua imagem de virgens na corrupção, passando inclusive a serem vistos como prostitutas veteranas dos escândalos. Graças ao Mensalão, o PT passou a ser visto como o mais sujo, o mais manipulador, e o mais corrupto partido de nosso país. Não que não exista certo exagero (de base midiática) nesses adjetivos. Aliás, essa é outra questão que suja ainda mais nossa política.

Que a mídia é utilizada em diversos países para a manipulação da vida política, não é segredo nenhum. E não só em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. Em países já desenvolvidos, como a Itália, a mídia manipula e conduz a política interna. Como por exemplo, citando o caso italiano, a holding Mediaset, de propriedade de Silvio Berlusconi, primeiro-ministro da Itália. A Mediaset, pertencente ao Grupo Fininvest (também de propriedade de Berlusconi), controla diversos canais de televisão aberta e fechada. E o primeiro-ministro italiano, de (extrema?) direita, simpatizante do fascismo, cristão devotado, não pensa duas vezes quando vê a necessidade de utilizar suas empresas para a manipulação e controle da informação, mantendo assim, a ordem e o bom andamento de seu governo. E não só nos canais controlados por ele, mas na televisão estatal, de propriedade do governo, também. A RAI, obviamente controlada por funcionários indicados por Berlusconi e sua equipe, também controla fortemente qualquer conteúdo "subversivo", e que possa fazer oposição à política do primeiro-ministro.

Não só na Itália, mas em outros países (assim como no Brasil), a mídia também trata de manipular as coisas à sua maneira, defendendo seus interesses sobre os do povo e da sociedade. Mas no Brasil creio que as coisas sejam até um pouco piores. Piores uma vez que praticamente toda a mídia brasileira é de direita. Ela é, em quase sua totalidade, neoliberal. Não há uma mídia conservadora, nacionalista. Não há uma mídia socialista, de esquerda. Forte, é claro. Revistas, e outros meios da chamada "imprensa independente" (como blogs), existem. Mas todos sabem que, num país onde não existe o hábito da leitura, não são revistas e jornais que conseguem levar informação às massas. No Brasil, isso é e será ainda por muito tempo, trabalho de televisão. E quanto a ela? Existem emissoras de esquerda? Existem emissoras nacionalistas?

Globo, Rede Record, SBT, Bandeirantes. Estes são os grandes nomes da tele difusão em nosso país. Politicamente, qual será a posição deles? Alguém tem alguma dúvida? Acredito que não. Todos são e sempre foram neoliberais. Alguns mais imparciais. Como é, em minha opinião, a Record. É a emissora que menos massacra e condena o governo. Mas, levando-se em conta a enorme rivalidade entre ela e a Globo, não duvido que tal postura seja somente para ir contra sua principal opositora. E claro, a Rede Globo, velha conhecida da direita brasileira, herança do Golpe Militar de 64, filhote da ditadura, mantém sua boa e velha postura. A de tentar sufocar qualquer governo não-aliado. Ou seja, qualquer governo não-neoliberal. Para sufocar Lula (esquerda trabalhista) e Brizola (conservador nacionalista), criou o Collor. Uma vez fracassada a política de sua criação, de seu "Frankenstein", a mesma trabalhou para tirá-lo do governo. Fez propaganda do Impeachment. Acho que esse fato caracteriza fielmente a postura global. Quanto ao SBT, segunda emissora do país, politicamente é difícil que se tire alguma conclusão. A emissora de Senor "Sílvio Santos" Abravanel pouco explora o campo da política. E pouco explora a informação. É uma televisora de platéia, de massa, de entretenimento. Mas acredito que não deva fugir muito da postura de suas companheiras de meio. E sobre a Band, o fato da família Saad ser historicamente ligada à direita cristã, creio que encerra esta análise precocemente.

Mas e a esquerda? Sobre a direita conservadora nacionalista, não falo. Não falo porque, no Brasil, ela se alia à direita neoliberal. E não falo também porque não existem partidos nacionalistas no nosso país. Mas sobre a esquerda podemos dizer, ela não tem voz. Ela não se expressa. A única linguagem da qual a esquerda brasileira se utiliza é a "imprensa independente". Aquela que não defende seus próprios interesses, uma vez que não os possui. É puramente informativa. Blogs, sites, estes só possuem como interesse informar às pessoas que os lêem. Mas e quanto à mídia de massa? Não existem redes de televisão aliadas à esquerda? Não. Nem sequer jornais de expressão, ou de grande circulação e que sejam simpatizantes da esquerda, existem. A grande mídia brasileira é totalmente voltada para a direita. Alguns veículos (e talvez os principais) nem sequer se esforçam para serem imparciais.
Como pode sobreviver então um governo popular de esquerda trabalhista, como o que temos agora, sem o apoio da mídia? Pois ele sobrevive somente apoiado em sua popularidade. É fato, que se tivéssemos outro presidente que não fosse o Lula, que não tivesse a popularidade que o ex-metalúrgico e líder sindical tem, com certeza já haveríamos sofrido o segundo impeachment em menos de vinte anos. Isso se deve ao fato do governo ser tão massacrado e sistematicamente acusado pela mídia brasileira. E para provar que não há imparcialidade, basta usar como exemplo o governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso.
Acredito que as pessoas mais informadas saibam que houve inúmeros casos de corrupção durante a gestão FHC. As privatizações e as operações "salva-bancos" do governo tucano são vistas como os episódios mais obscuros e misteriosos de nossa vida política nos últimos anos. Inúmeras irregularidades aconteceram durante este período, das quais sempre tive conhecimento, uma vez que meu pai era um dos diretores da Eletropaulo na época de sua privatização, articulada pelo eixo Covas-FHC. Propinas para cá, propinas para lá. Ameaças, contratos ilegais, acordos duvidosos, tudo isso fez parte dessa época negra, da qual meu pai possui verdadeira aversão e nojo. Mas na época, se existia tudo isso, porque não haviam denúncias? Pois havia. Durante o governo FHC, cerca de 500 denúncias de irregularidades foram engavetadas pelo então Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro. O "Engavetador-Geral da República", como passou a ser chamado, fez a maior operação de "abafa" de nossa história política. Perto das denúncias feitas referentes ao período das privatizações, o Mensalão poderia parecer uma partícula de poeira em meio ao Oceano Pacífico.

Contando com o apoio estratégico governamental na época, a mídia brasileira (a "mídia marrom", é claro) fez também o seu papel de abafar e manter a boa imagem, a "bella figura", de Fernando Henrique. Falava-se nas privatizações, sim. Em como elas ajudariam (como de fato algumas ajudaram) no progresso do país. No dinheiro que seria gerado por elas. Na economia de gastos do governo, etc., etc. Se falavam nas coisas boas. Nas irregularidades, ainda que não tão aparentes na época, não se falavam. E hoje, após verificar que o dinheiro que os cofres públicos deveriam ter recebido com as vendas de inúmeras estatais simplesmente sumiu, e que as obras que deveriam ter sido feitas com ele, os projetos, os planos, simplesmente não existiram, ainda assim, não se fala sobre o assunto. A mídia ainda hoje faz seu papel de mãe super-protetora do antigo governo. Para isso, para que se denunciem os absurdos das privatizações (dos quais tenho conhecimento desde os meus 11, 12 anos de idade), será necessária a publicação do livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr. Ele será a peça chave para que se desvendem os segredos obscuros daquela época. E o pior de tudo, é que Ribeiro Jr. nem sequer é ligado ao PT. É ligado a Aécio Neves, do próprio PSDB. E nem sequer pode ser desqualificado pela Folha, uma vez que nela já trabalhou.


Estamos em 2010, ano de eleições. Esse é mais um cenário no qual a mídia brasileira gosta de trabalhar. Ela faz seu jogo. Principalmente a revista Veja, o jornal Folha, e a TV Globo. Juntos eles formam um Eixo do Mal. E nessas eleições, tal eixo parece estar mais maléfico do que nunca. O "Fiscogate" ou "Receitagate", escândalo surgido em meio à disputa eleitoral, quando a candidata do governo-oposição (governo, pois dará continuidade ao mesmo, e oposição, pois é opositora dos interesses da mídia) está liderando as pesquisas. É como um gol aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo. Chegou na hora “H”. Este escândalo, que curiosamente parece seguir os mesmos passos do "Caso Lunus" (que tirou Roseana Sarney da disputa presidencial em 2002) e do Escândalo dos Aloprados (que em 2006 conseguiu levar o apagado candidato tucano Geraldo Alckmin ao segundo turno), está sendo amplamente divulgado por toda a imprensa. Nenhuma prova que pudesse ligar o governo ou a candidata Dilma Rousseff ao esquema foi apresentada até agora. Mas mesmo assim, Veja, Folha e Globo, parecem cumprir fielmente seu papel de escudeiros da direita. A diferença, é que parece que o povo brasileiro está mudado. Algo aconteceu, e fez com que a opinião pública aprendesse a ler com outros olhos as matérias feitas pelo Eixo do Mal. Talvez isto explique também a queda cada vez maior na circulação da revista Veja.

Se na época das eleições Dilma Rousseff já está sendo massacrada pela mídia de maneira tão impiedosa, imaginemos como será quando ela assumir o governo. E só para relembrar: primeiro vieram as matérias sobre o passado da candidata, que a classificaram como guerrilheira, terrorista, assaltante de bancos, alguém que não poderia visitar outros países como Chefe de Estado, pois estaria proibida de entrar, por exemplo, nos EUA. Mentiras, mentiras absurdas. Depois surgiu o "Receitagate". Folha-Veja-Globo tentando, de qualquer maneira, levar o caso do vazamento de sigilos para perto da candidata petista. Sem provas, mas com inúmeros indícios e fartas acusações. Falhou. Inclusive, no tracking Vox Populi de hoje, Dilma subiu um ponto, está com 54%. Serra caiu um ponto, com 22%. Logo, uma vez que o "Receitagate" não surtiu efeitos, é hora de explorar o caso de lobby na Casa Civil, liderado por Israel, filho da Ministra-Chefe da mesma, Erenice Guerra. Essa será a nova arma do Eixo do Mal, também chamado de PiG (Partido da imprensa Golpista), sigla criada pelo jornalista Paulo Henrique Amorim. Manipulação. De informações e do povo. Como sempre.

E novamente, pergunto: e a esquerda? Será que ela conta somente com a revista CartaCapital (de Mino Carta) para sua defesa? Sim. Somente. Inclusive, defendo a idéia de que Mino Carta deveria fundar, com apoio do governo (sim, porque não?), um grupo de comunicação. Mino Carta, empresário, jornalista, editor e escritor brasileiro de trajetória brilhante e admirável, deveria possuir uma rede de televisão e um jornal. Seria a única maneira de a esquerda ter uma voz. Não só a esquerda, mas todos os "anti-neoliberais". Enfim, uma oposição à mídia tradicional brasileira. Se pretendemos ser um país respeitado, grande, importante, devemos contar com uma mídia diversa. Como uma imprensa, ou imparcial, ou parcial para todas as vertentes. Afinal, este país não é feito só de neoliberais. Nem só de direita. Portanto, sem uma voz grave, alta, que grite para todo o Brasil ouvir, a esquerda em nosso país conta somente com a mídia independente. Pequena, modesta e frágil. "Blogs sujos", como disse Verônica Serra ao seu pai. Inclusive, por citar a senhora Verônica é que me lembrei. Acho uma pena que ninguém do Eixo do Mal fale sobre as quebras de sigilos bancários e fiscais de cerca de 60 milhões de brasileiros feitos pela empresa de Verônica Serra, a Decidir.com, durante o governo de FHC. Sobrou para CartaCapital, mais uma vez, informar aos brasileiros sobre este fato. De mostrar que antes de atirar pedras no telhado de alguém, devemos nos certificar de que o nosso também não seja feito de vidro. E, infelizmente, duvido que a CartaCapital chegue a bancas de todo o país, como é o caso da Veja.

É esta a nossa situação política hoje. Sujeiras, acusações e conturbação. Não sabemos em quem confiar ou em quem acreditar. Parece que o nível na política brasileira está caindo cada vez mais. Parece que, a cada passo que damos à frente, damos mais dois para trás. E com a ajuda da tradicional "mídia marrom", do PiG e do Eixo do Mal, este nível não vai subir tão cedo. Ao contrário, parece que o que a nossa imprensa mais quer, é que seja colocada mais lenha na fogueira. Mas, infelizmente, sabemos que este fogo só consome a alguns.