quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Tapa com luva de pelica.

Nada como levar um tapa com luva de pelica, com elegância e sutileza, de Luís Fernando Veríssimo, não é Serra?
Segue o comentário elegante e bem educado de Luís Fernando Veríssimo após declarações de José Serra durante a sabatina do jornal O Globo com o candidato à presidência. Serra respondeu à uma pergunta de Luís Fernando Veríssimo, como sempre, de maneira ríspida e pouco humilde. Levou uma resposta à altura. Aliás, levou uma resposta de nível bem mais elevado. Vide:


"Foster Dulles"

"Não pude ir à sabatina dos candidatos à Presidência feita por colunistas e leitores de O Globo na semana passada, mas mandei perguntas por e-mail. Respondendo à minha pergunta sobre se, caso ele fosse eleito, a política externa brasileira voltaria a ser a que era antes do governo Lula, mais alinhada com os Estados Unidos, Serra respondeu que teria uma política própria, presumivelmente diferente da política do Fernando Henrique também. Mas antes fez um preâmbulo, lembrando o livro O Senhor Embaixador, em que, segundo Serra, meu pai se revela um admirador de John Foster Dulles, secretário de Estado americano que foi o grande estrategista da Guerra Fria com a União Soviética, famoso pela sua doutrina do “brinkmanship”, ou a arte de levar as confrontações até a beira de uma guerra quente, sem dar o passo fatal. “No caso da família Verissimo, houve uma alternância”, disse Serra, pois o filho, eu, “passou para o lado contrário em matéria de questão externa”. Não entendi: o lado contrário do que, da Guerra Fria? Posso garantir que não sou pelo alinhamento da nossa política externa com a União Soviética contra o Foster Dulles, mesmo se conseguíssemos encontrar os dois ainda vivos, e mesmo que meu desejo valesse alguma coisa.




Como eu, o Serra deve ter lido O Senhor Embaixador há algum tempo. Não surpreende que não se lembre bem do que leu. Foster Dulles foi, sim, uma figura admirável, do ponto de vista puramente literário. Incorporava um certo tipo de aristocracia americana que durante algum tempo fez do Departamento de Estado o seu feudo fechado e do anticomunismo sua principal faina intelectual. Depois, esse patriciado estanque foi substituído por tecnocratas tipo McNamara, que deram o passo fatal além da beira e empurraram o país para o abismo do Vietnã. Nenhum tinha aquela empáfia de nascença que caracterizava Dulles e seus pares e mal camuflava sua arrogância. Meu pai não admirava a política de Dulles, Serra. Um personagem do livro expressa sua opinião sobre Dulles como a fascinante figura literária que foi.


O Senhor Embaixador foi baseado, em boa parte, na experiência do meu pai como diretor de assuntos culturais da União Pan-Americana, ligada à Organização dos Estados Americanos, em Washington, de 1953 a 1956. A personalidade que, este sim, ele mais admirou no período foi Alberto Lleras Camargo, ex-presidente da Colômbia pelo Partido Liberal que dirigiu a OEA até 54 e saiu do cargo fazendo um famoso discurso em que desancava a intromissão americana em assuntos internos da América Latina e propunha um novo relacionamento, não submisso, dos latinos com os Estados Unidos. Lleras Camargo foi o primeiro estadista latino-americano da sua estatura e com suas credenciais a dizer coisa parecida. Recomendo ao Serra que, quando tiver tempo, leia Solo de Clarineta, vol.1, livro de memórias do meu pai, para saber com que figuras ele realmente simpatizou, na época, e com quem concordava."

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Brasil, o cesto de lixo político.

O Brasil é hoje uma das grandes promessas do futuro. Não é à toa que fazemos parte do BRIC (bloco de países emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China). Somos também os líderes do ranking de países que lutam pela redução da pobreza. Somos hoje líderes regionais. Presidentes de todas as nações do continente vêm ao Brasil para pedir "a benção" do nosso Chefe de Estado. Somos hoje um dos países mais influentes do mundo. Tanto política quanto economicamente. Deixamos de ser um "paisinho" em desenvolvimento, aliado à política americana, submisso ao neoliberalismo, para nos tornarmos mais um país governado pela esquerda, mas de enorme importância para o andamento do capitalismo mundial.

Porém, se na política externa e na economia vamos indo bem (ainda com muito que melhorar), na política interna, ou seja, no nosso próprio quintal, vamos de mal a pior. Isso se deve ao fato de que o brasileiro não sabe mais em quem acreditar. A ética na política parece que se tornou uma coisa distante, rara. O que deveria ser o básico se tornou um artigo de luxo que pode acompanhar, ou não, partidos políticos e seus membros. Exemplo disso é o PT, partido que nos governa hoje. Subiu ao poder em 2002, como a nova esperança do povo brasileiro, um partido popular, trabalhista, íntimo dos mais necessitados de nosso país, e porta estandarte da esquerda brasileira. Tal imagem, limpa e imaculada a nível nacional, foi dizimada com o surgimento do escândalo do Mensalão em 2005 e 2006. O PT manteve-se no governo, pois puniu alguns (somente alguns) responsáveis pelo escândalo. Mas salvou-se, na verdade, graças à popularidade do presidente Lula entre o povo. Foi a credibilidade do próprio Lula, e não mais a do PT, que manteve seu governo em Brasília.

Após o Mensalão, o PT passou a figurar na galeria dos "partidos não-confiáveis", junto a outros partidos já conhecidos por escândalos de corrupção, como o PP do ilustre Paulo Maluf. Logo, os políticos do PT perderam sua imagem de virgens na corrupção, passando inclusive a serem vistos como prostitutas veteranas dos escândalos. Graças ao Mensalão, o PT passou a ser visto como o mais sujo, o mais manipulador, e o mais corrupto partido de nosso país. Não que não exista certo exagero (de base midiática) nesses adjetivos. Aliás, essa é outra questão que suja ainda mais nossa política.

Que a mídia é utilizada em diversos países para a manipulação da vida política, não é segredo nenhum. E não só em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. Em países já desenvolvidos, como a Itália, a mídia manipula e conduz a política interna. Como por exemplo, citando o caso italiano, a holding Mediaset, de propriedade de Silvio Berlusconi, primeiro-ministro da Itália. A Mediaset, pertencente ao Grupo Fininvest (também de propriedade de Berlusconi), controla diversos canais de televisão aberta e fechada. E o primeiro-ministro italiano, de (extrema?) direita, simpatizante do fascismo, cristão devotado, não pensa duas vezes quando vê a necessidade de utilizar suas empresas para a manipulação e controle da informação, mantendo assim, a ordem e o bom andamento de seu governo. E não só nos canais controlados por ele, mas na televisão estatal, de propriedade do governo, também. A RAI, obviamente controlada por funcionários indicados por Berlusconi e sua equipe, também controla fortemente qualquer conteúdo "subversivo", e que possa fazer oposição à política do primeiro-ministro.

Não só na Itália, mas em outros países (assim como no Brasil), a mídia também trata de manipular as coisas à sua maneira, defendendo seus interesses sobre os do povo e da sociedade. Mas no Brasil creio que as coisas sejam até um pouco piores. Piores uma vez que praticamente toda a mídia brasileira é de direita. Ela é, em quase sua totalidade, neoliberal. Não há uma mídia conservadora, nacionalista. Não há uma mídia socialista, de esquerda. Forte, é claro. Revistas, e outros meios da chamada "imprensa independente" (como blogs), existem. Mas todos sabem que, num país onde não existe o hábito da leitura, não são revistas e jornais que conseguem levar informação às massas. No Brasil, isso é e será ainda por muito tempo, trabalho de televisão. E quanto a ela? Existem emissoras de esquerda? Existem emissoras nacionalistas?

Globo, Rede Record, SBT, Bandeirantes. Estes são os grandes nomes da tele difusão em nosso país. Politicamente, qual será a posição deles? Alguém tem alguma dúvida? Acredito que não. Todos são e sempre foram neoliberais. Alguns mais imparciais. Como é, em minha opinião, a Record. É a emissora que menos massacra e condena o governo. Mas, levando-se em conta a enorme rivalidade entre ela e a Globo, não duvido que tal postura seja somente para ir contra sua principal opositora. E claro, a Rede Globo, velha conhecida da direita brasileira, herança do Golpe Militar de 64, filhote da ditadura, mantém sua boa e velha postura. A de tentar sufocar qualquer governo não-aliado. Ou seja, qualquer governo não-neoliberal. Para sufocar Lula (esquerda trabalhista) e Brizola (conservador nacionalista), criou o Collor. Uma vez fracassada a política de sua criação, de seu "Frankenstein", a mesma trabalhou para tirá-lo do governo. Fez propaganda do Impeachment. Acho que esse fato caracteriza fielmente a postura global. Quanto ao SBT, segunda emissora do país, politicamente é difícil que se tire alguma conclusão. A emissora de Senor "Sílvio Santos" Abravanel pouco explora o campo da política. E pouco explora a informação. É uma televisora de platéia, de massa, de entretenimento. Mas acredito que não deva fugir muito da postura de suas companheiras de meio. E sobre a Band, o fato da família Saad ser historicamente ligada à direita cristã, creio que encerra esta análise precocemente.

Mas e a esquerda? Sobre a direita conservadora nacionalista, não falo. Não falo porque, no Brasil, ela se alia à direita neoliberal. E não falo também porque não existem partidos nacionalistas no nosso país. Mas sobre a esquerda podemos dizer, ela não tem voz. Ela não se expressa. A única linguagem da qual a esquerda brasileira se utiliza é a "imprensa independente". Aquela que não defende seus próprios interesses, uma vez que não os possui. É puramente informativa. Blogs, sites, estes só possuem como interesse informar às pessoas que os lêem. Mas e quanto à mídia de massa? Não existem redes de televisão aliadas à esquerda? Não. Nem sequer jornais de expressão, ou de grande circulação e que sejam simpatizantes da esquerda, existem. A grande mídia brasileira é totalmente voltada para a direita. Alguns veículos (e talvez os principais) nem sequer se esforçam para serem imparciais.
Como pode sobreviver então um governo popular de esquerda trabalhista, como o que temos agora, sem o apoio da mídia? Pois ele sobrevive somente apoiado em sua popularidade. É fato, que se tivéssemos outro presidente que não fosse o Lula, que não tivesse a popularidade que o ex-metalúrgico e líder sindical tem, com certeza já haveríamos sofrido o segundo impeachment em menos de vinte anos. Isso se deve ao fato do governo ser tão massacrado e sistematicamente acusado pela mídia brasileira. E para provar que não há imparcialidade, basta usar como exemplo o governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso.
Acredito que as pessoas mais informadas saibam que houve inúmeros casos de corrupção durante a gestão FHC. As privatizações e as operações "salva-bancos" do governo tucano são vistas como os episódios mais obscuros e misteriosos de nossa vida política nos últimos anos. Inúmeras irregularidades aconteceram durante este período, das quais sempre tive conhecimento, uma vez que meu pai era um dos diretores da Eletropaulo na época de sua privatização, articulada pelo eixo Covas-FHC. Propinas para cá, propinas para lá. Ameaças, contratos ilegais, acordos duvidosos, tudo isso fez parte dessa época negra, da qual meu pai possui verdadeira aversão e nojo. Mas na época, se existia tudo isso, porque não haviam denúncias? Pois havia. Durante o governo FHC, cerca de 500 denúncias de irregularidades foram engavetadas pelo então Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro. O "Engavetador-Geral da República", como passou a ser chamado, fez a maior operação de "abafa" de nossa história política. Perto das denúncias feitas referentes ao período das privatizações, o Mensalão poderia parecer uma partícula de poeira em meio ao Oceano Pacífico.

Contando com o apoio estratégico governamental na época, a mídia brasileira (a "mídia marrom", é claro) fez também o seu papel de abafar e manter a boa imagem, a "bella figura", de Fernando Henrique. Falava-se nas privatizações, sim. Em como elas ajudariam (como de fato algumas ajudaram) no progresso do país. No dinheiro que seria gerado por elas. Na economia de gastos do governo, etc., etc. Se falavam nas coisas boas. Nas irregularidades, ainda que não tão aparentes na época, não se falavam. E hoje, após verificar que o dinheiro que os cofres públicos deveriam ter recebido com as vendas de inúmeras estatais simplesmente sumiu, e que as obras que deveriam ter sido feitas com ele, os projetos, os planos, simplesmente não existiram, ainda assim, não se fala sobre o assunto. A mídia ainda hoje faz seu papel de mãe super-protetora do antigo governo. Para isso, para que se denunciem os absurdos das privatizações (dos quais tenho conhecimento desde os meus 11, 12 anos de idade), será necessária a publicação do livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr. Ele será a peça chave para que se desvendem os segredos obscuros daquela época. E o pior de tudo, é que Ribeiro Jr. nem sequer é ligado ao PT. É ligado a Aécio Neves, do próprio PSDB. E nem sequer pode ser desqualificado pela Folha, uma vez que nela já trabalhou.


Estamos em 2010, ano de eleições. Esse é mais um cenário no qual a mídia brasileira gosta de trabalhar. Ela faz seu jogo. Principalmente a revista Veja, o jornal Folha, e a TV Globo. Juntos eles formam um Eixo do Mal. E nessas eleições, tal eixo parece estar mais maléfico do que nunca. O "Fiscogate" ou "Receitagate", escândalo surgido em meio à disputa eleitoral, quando a candidata do governo-oposição (governo, pois dará continuidade ao mesmo, e oposição, pois é opositora dos interesses da mídia) está liderando as pesquisas. É como um gol aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo. Chegou na hora “H”. Este escândalo, que curiosamente parece seguir os mesmos passos do "Caso Lunus" (que tirou Roseana Sarney da disputa presidencial em 2002) e do Escândalo dos Aloprados (que em 2006 conseguiu levar o apagado candidato tucano Geraldo Alckmin ao segundo turno), está sendo amplamente divulgado por toda a imprensa. Nenhuma prova que pudesse ligar o governo ou a candidata Dilma Rousseff ao esquema foi apresentada até agora. Mas mesmo assim, Veja, Folha e Globo, parecem cumprir fielmente seu papel de escudeiros da direita. A diferença, é que parece que o povo brasileiro está mudado. Algo aconteceu, e fez com que a opinião pública aprendesse a ler com outros olhos as matérias feitas pelo Eixo do Mal. Talvez isto explique também a queda cada vez maior na circulação da revista Veja.

Se na época das eleições Dilma Rousseff já está sendo massacrada pela mídia de maneira tão impiedosa, imaginemos como será quando ela assumir o governo. E só para relembrar: primeiro vieram as matérias sobre o passado da candidata, que a classificaram como guerrilheira, terrorista, assaltante de bancos, alguém que não poderia visitar outros países como Chefe de Estado, pois estaria proibida de entrar, por exemplo, nos EUA. Mentiras, mentiras absurdas. Depois surgiu o "Receitagate". Folha-Veja-Globo tentando, de qualquer maneira, levar o caso do vazamento de sigilos para perto da candidata petista. Sem provas, mas com inúmeros indícios e fartas acusações. Falhou. Inclusive, no tracking Vox Populi de hoje, Dilma subiu um ponto, está com 54%. Serra caiu um ponto, com 22%. Logo, uma vez que o "Receitagate" não surtiu efeitos, é hora de explorar o caso de lobby na Casa Civil, liderado por Israel, filho da Ministra-Chefe da mesma, Erenice Guerra. Essa será a nova arma do Eixo do Mal, também chamado de PiG (Partido da imprensa Golpista), sigla criada pelo jornalista Paulo Henrique Amorim. Manipulação. De informações e do povo. Como sempre.

E novamente, pergunto: e a esquerda? Será que ela conta somente com a revista CartaCapital (de Mino Carta) para sua defesa? Sim. Somente. Inclusive, defendo a idéia de que Mino Carta deveria fundar, com apoio do governo (sim, porque não?), um grupo de comunicação. Mino Carta, empresário, jornalista, editor e escritor brasileiro de trajetória brilhante e admirável, deveria possuir uma rede de televisão e um jornal. Seria a única maneira de a esquerda ter uma voz. Não só a esquerda, mas todos os "anti-neoliberais". Enfim, uma oposição à mídia tradicional brasileira. Se pretendemos ser um país respeitado, grande, importante, devemos contar com uma mídia diversa. Como uma imprensa, ou imparcial, ou parcial para todas as vertentes. Afinal, este país não é feito só de neoliberais. Nem só de direita. Portanto, sem uma voz grave, alta, que grite para todo o Brasil ouvir, a esquerda em nosso país conta somente com a mídia independente. Pequena, modesta e frágil. "Blogs sujos", como disse Verônica Serra ao seu pai. Inclusive, por citar a senhora Verônica é que me lembrei. Acho uma pena que ninguém do Eixo do Mal fale sobre as quebras de sigilos bancários e fiscais de cerca de 60 milhões de brasileiros feitos pela empresa de Verônica Serra, a Decidir.com, durante o governo de FHC. Sobrou para CartaCapital, mais uma vez, informar aos brasileiros sobre este fato. De mostrar que antes de atirar pedras no telhado de alguém, devemos nos certificar de que o nosso também não seja feito de vidro. E, infelizmente, duvido que a CartaCapital chegue a bancas de todo o país, como é o caso da Veja.

É esta a nossa situação política hoje. Sujeiras, acusações e conturbação. Não sabemos em quem confiar ou em quem acreditar. Parece que o nível na política brasileira está caindo cada vez mais. Parece que, a cada passo que damos à frente, damos mais dois para trás. E com a ajuda da tradicional "mídia marrom", do PiG e do Eixo do Mal, este nível não vai subir tão cedo. Ao contrário, parece que o que a nossa imprensa mais quer, é que seja colocada mais lenha na fogueira. Mas, infelizmente, sabemos que este fogo só consome a alguns.