sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Quando a violência bate à porta

Assistir a um jornal televisivo no Brasil é garantia de se ver muitas tragédias, muitos problemas e de se ter uma pequena amostra grátis do que é o dia-a-dia de milhões de brasileiros vítimas da violência. Porém, através de um aparelho de televisão, a história pode parecer uma. Mas, na vida real, ela é bem diferente. Quando você sente a violência na pele, ocorre uma drástica mudança na sua maneira de enxergar as coisas.

Nos últimos anos, o desenvolvimento e o crescimento do Brasil têm impressionado e empolgado. Não só a brasileiros, mas como também a estrangeiros. Empregos, dinheiro, progresso, um mercado consumidor forte. Esses parecem ser os ingredientes para o verdadeiro “milagre brasileiro”. Milagre que parece ter acontecido inteiramente na chamada “Era Lula”. Mas em minha cabeça, tais ingredientes não são o suficiente para que se faça o bolo chamado “desenvolvimento”. Se economicamente estamos bem, no resto, ainda estamos bem mal.

A distribuição de renda, que tem melhorado nos últimos anos, ainda é, em minha modesta opinião, a principal causa para a violência urbana. E é claro, a mentalidade brasileira - em parte baseada na mentalidade estadunidense -, que valoriza o consumismo e os bens materiais, ajuda a manter este índice de violência elevado. Todos precisam consumir, comprar e ter. E quando parte da sociedade não possui desenvolvimento econômico suficiente para fazer estas três coisas, então surge a violência.

Nos anos 90, principalmente após 1995, nosso país passou por um processo de neoliberalização, que incluiu a privatização da propriedade pública e a entrega de boa parte dos serviços e de empresas nacionais a grandes grupos empresariais. As grandes corporações tornaram-se donas de parte do Brasil e do patriomônio que, por direito e justiça, pertenciam ao povo brasileiro. As consequências disso? Concentração de renda. Enriquecimento dos ricos e empobrecimento dos pobres. Abriu-se um abismo social no Brasil. Abismo este que perdura até hoje.

O abismo social causado pela empreitada neoliberal aumentou a violência, entregou as cidades ao tráfico de drogas e ao crime organizado. A inércia dos governos enfraquecidos pela mentalidade neoliberal - que prega a diminuição da influência do Estado sobre os problemas da sociedade - fez com que o crime tomasse conta. As taxas de criminalidade aumentaram. O dólar baixo permitiu que brasileiros (classes média alta e alta) fizessem uma festa no exterior e no mercado interno, aumentando o consumo. E foi exatamente este que impulsionou o aumento da criminalidade. Se os ricos podem ter, os pobres também possuem o mesmo direito, e com certeza, farão o possível para comprar as coisas que desejam. Isso tudo causado pelo consumismo e pela valorização excessiva do material. Pois uma sociedade é feita de exemplos.

E assim a criminalidade tomou conta. Lembro-me de ouvir os primeiros casos de assaltos a residências nos anos 90. Os primeiros casos de latrocínio. Casos isolados, naquela época. Diferente de hoje, onde estes acontecimentos tornam-se cada vez mais frequentes. E hoje, ele bateu à minha porta. Um episódio aterrorizante e que levarei em minha mente para o resto de minha vida. Vi minha mãe descontrolada, tremendo, emitindo sons (não eram palavras) e sendo ameaçada de morte por um jovem (de no máximo 19 anos), com o nome “Diana” tatuado no braço. Tive que tapar a boca de minha própria mãe. Algo que jamais me esquecerei.


Agora, sendo parte de uma triste e deprimente estatística, possuo uma visão ainda mais crítica sobre os problemas de nosso país. Ódio dos bandidos? Não. Por mais que eu tente, meu lado racional me faz pensar no nome “Diana”. Quem será ela? A mãe de um dos bandidos? Esposa? Quem sabe até mesmo uma filha. Uma mulher que talvez viva na favela, em meio à violência cotidiana, com diversos filhos. Filhos estes que, por falta de oportunidade e influenciados pela sociedade consumista e fútil que os cercam, se entregam à uma vida de violência, em busca de dinheiro e bens materiais. Talvez drogas também. Portanto, ódio não é um sentimento que se deve nutrir nestas horas. Pena também não. Mas devemos sim, olhar para os problemas de maneira crítica. Devemos tentar compreender as causas desta violência que toma conta de nossas ruas. Esta é a única maneira de percebemos que os ingredientes consumismo, bens materiais e dinheiro, não são os únicos formadores de uma sociedade desenvolvida. Eles devem ser um detalhe.

É por isso que espero, como brasileiro, que a distribuição de renda continue. E que melhore. E que o dinheiro não continue a ser o único poder realmente existente em nossa sociedade. Mas ainda há muito pela frente. Da maneira como estamos caminhando, aliás, a chegada do verdadeiro desenvolvimento está bem distante. Porque, por enquanto, só posso dizer uma coisa: desenvolvimento, estamos fazendo errado.